Encontro sobre «O impacto das migrações em Portugal»

Jerónimo de Sousa garante<br>Recusaremos a ideia de uma «Europa fortaleza»

Jerónimo de Sousa, na intervenção de encerramento do Encontro (seguem-se extractos), apontou a necessidade de considerar esta nossa «dupla condição» de país de emigração e de imigração, com vista a actualizar a orientações e propostas a inserir na política alternativa que o PCP vai propor ao povo português na Conferência Nacional sobre Questões Económicas e Sociais.

A imigração é necessária e desejável para garantir o equilíbrio demográfico

«(...) A dimensão das migrações contemporâneas, que nos últimos 25 anos fez quase duplicar e número de pessoas a viver fora do seu país é uma consequência dos processos de globalização capitalista e da sua dinâmica predadora e criadora de crescentes desigualdades a nível mundial entre os países mais ricos e os países mais pobres.
(...) É no quadro de uma hipócrita política de classe que se esconde atrás dos argumentos de uma inexistente política de imigração de “portas escancaradas” que na Europa se refinam, com a aplicação de novos meios e novos métodos, as políticas de concretização na prática a ideia de uma “ Europa fortaleza” por cima dos mais elementares direitos dos imigrantes. Políticas que Portugal acompanha em muitas das suas vertentes.
Com o recente acordo do tratado dito reformador, mas que é a cópia do recusado “tratado constitucional”, dá-se um passo de gigante nessa direcção com a comunitarização das políticas de imigração, agora por decisão apenas da maioria e que tem no sistema de quotas, na implementação de uma imigração selectiva nomeadamente com a introdução da “carta azul”, nas equipas de intervenção rápida, nos centros de detenção para emigrantes, no Sistema Intensivo de Vigilância Externa, nos instrumentos de recolha de dados biométricos para a criação de bases de dados pessoais com os inerentes riscos de abusos, alguns dos seus componentes.
Não deixa de ser significativo da verdadeira natureza de classe de tais orientações e dos governos ao serviço do capital que as defendem e concretizam o facto de nenhum dos países europeus que recebem fluxos migratórios tenha, até hoje, ratificado a Convenção Internacional sobre Protecção de todos os Trabalhadores Migrantes e Membros das suas Famílias elaborada sob aos auspícios da ONU.
(...) Da nossa parte não só recusaremos a ideia de uma “Europa fortaleza” como nos distanciamos de uma política comum de imigração que, para além de não responder às diferentes realidades de cada país e pôr em causa a soberania nacional, assenta numa unilateral concepção utilitarista e discriminatória que faz tábua rasa dos direitos dos imigrantes e alimenta a xenofobia e o racismo. Mais que uma política comum, o que é necessário é outra política e outras medidas que não rejeitando a possibilidade de cooperação entre países, efectivamente protejam os direitos dos imigrantes e combatam as causas profundas da imigração.

Fluxos migratórios aumentam

(...) Hoje muitos milhares de portugueses rumam novamente ao estrangeiro à procura de trabalho e de melhores condições de vida e o mesmo passaram a fazer, particularmente nestes três últimos anos, muitos daqueles, e são já muitos milhares, que tentaram encontrar no nosso país uma saída digna para a sua vidas e dos seus.
(...) É por isso que continuamos a lutar por uma verdadeira reestruturação dos serviços consulares que ponha fim às medidas avulsas de encerramento de consulados de carreira e sua substituição por consulados honorários, naturalmente vocacionados para a defesa de interesses particulares e não de prestação do interesse público (...), não abdicaremos de lutar por um conjunto de propostas que vão ao encontro das reais necessidades e interesses das nossas comunidades, entre as quais: a criação de um programa de promoção, expansão e qualificação do ensino da Língua e Cultura portuguesas (...).
O Governo do PS, na senda do que tem sido a política de direita dos sucessivos governos, olha para os portugueses da diáspora como um instrumento para o desenvolvimento da sua política e nem sequer tem em conta o seu forte contributo para a economia portuguesa. Em 2006, as remessas dos emigrantes cifraram-se em 7.276 milhões de euros, valor que sendo inferior ao passado constitui, apesar de tudo, uma verba vultuosa, qualquer coisa como cerca de 4,7% do PIB. (Fonte: Banco de Portugal).
Povo de emigrantes que tem cerca de cinco milhões dos seus membros espalhados por todos os continentes, nós, os portugueses, estamos bem colocados para compreender e apoiar os que junto de nós procuram um emprego, um salário, uma vida mais digna. No entanto, não foi essa a principal característica das políticas adoptadas em Portugal ao longo de muitos anos.
(...) Para nós, para além do respeito e solidariedade que são devidos a quem procura em Portugal as condições de subsistência, quase sempre à custa de enormes sacrifícios, a imigração é não apenas necessária, como é desejável para garantir o equilíbrio demográfico, para a sustentabilidade dos regimes de segurança social e para a promoção do nossa própria actividade económica.
O PCP sempre considerou que o combate eficaz à imigração ilegal passa por viabilizar a imigração legal, acabando com o absurdo sistema de “quotas” constante da “lei de estrangeiros” e por adoptar critérios mais flexíveis de entrada em Portugal para quem pretenda exercer uma actividade profissional. Tal como passa também por fiscalizar e sancionar devidamente o patronato que se aproveita da imigração ilegal para explorar os trabalhadores estrangeiros, explorando a sua situação de fragilidade e pelo combate às redes de tráfico de mão-de-obra ilegal e as associações criminosas que dela se alimentam.
Mas, é indispensável permitir que os trabalhadores estrangeiros em Portugal tenham a possibilidade de legalizar a sua situação e de poder viver entre nós com os seus familiares sem terem os seus direitos diminuídos e sem estarem reféns daqueles que beneficiam com a imigração ilegal.

Por acção do PCP

(...) Há cerca de 10 anos atrás, a luta e iniciativa política do PCP ficou associada à lei então aprovada sobre os direitos das associações de imigrantes e à primeira lei aprovada em Portugal contra a discriminação racial. Assim como nos últimos tempos, a acção política e a iniciativa legislativa do PCP estão associadas às alterações positivas introduzidas nas Lei da Nacionalidade e na Lei da Imigração.
Quando o PCP apresentou o seu projecto de alteração à Lei da Nacionalidade, em 2005, fê-lo por razões de elementar justiça. A Lei da Nacionalidade Portuguesa, que vigorava até ao ano passado, considerava portugueses de origem os filhos de portugueses nascidos em qualquer parte do mundo. Ao invés, não considerava portugueses de origem os filhos de estrangeiros nascidos em Portugal, ainda que tivessem vivido em Portugal por toda a sua vida e não tivessem conhecido, sequer, qualquer outro país.
O projecto de lei da Nacionalidade, apresentado pelo PCP, previa o reconhecimento da nacionalidade portuguesa originária a todos os cidadãos nascidos em território português, filhos de estrangeiros aqui residentes a qualquer título, desde que fosse essa a vontade dos progenitores.
O processo que culminou nas últimas alterações à Lei da Nacionalidade, no qual o PCP participou muito empenhadamente, não consagrou inteiramente as nossas propostas, mas não deixou de ser um passo muito importante e de consagrar soluções mais justas e adequada do que as que vigoravam antes, nomeadamente a consagração da atribuição da nacionalidade portuguesa de origem aos nascidos em território português, filhos de estrangeiros, desde que, no momento do nascimento, um dos progenitores aqui resida legalmente há pelo menos 5 anos. Há aspectos que não têm o nosso acordo, mas foi um avanço que abriu um caminho para que muitos cidadãos possam ver reconhecida a cidadania portuguesa que injustamente lhes tem sido negada.
Quanto à Lei da Imigração, o PCP orgulha-se de ter apresentado, também através do seu Grupo Parlamentar na Assembleia da República, o primeiro projecto de lei desta legislatura destinado a alterá-la profundamente, dando cumprimento a um compromisso assumido no seu Programa Eleitoral. O Projecto de Lei do PCP propôs uma revisão global da “lei de imigração” tendo como aspectos fundamentais:
- A conversão da autorização de residência em regra para a admissão e para a regularização da permanência em Portugal por razões de trabalho, estudo, de formação ou de investigação científica;
- A eliminação das “autorizações de permanência”, garantindo aos cidadãos abrangidos o direito à obtenção de autorização de residência;
- O abandono das fracassadas políticas de quotas para imigrantes;
O PCP não votou favoravelmente a nova lei, mas não deixa por isso de salientar que esta lei, para a qual o PCP muito contribuiu, representa um progresso em relação à situação que até então tínhamos.

Pela igualdade de direitos

(...) O PCP continua a não se identificar com princípios basilares da legislação vigente e que se vão manter na nova lei e por isso não lhe deu o seu voto favorável, porque esta lei não resolve todos os problemas que seria importante resolver, e não conseguirá acabar com o flagelo da imigração clandestina e do trabalho ilegal. Contudo, Portugal terá pela primeira vez, desde há muitos anos, uma lei que representa um progresso para os direitos dos imigrantes e das suas famílias, que vai possibilitar em definitivo a legalização de muitos milhares de cidadãos que permanecem entre nós em situação ilegal, e esperemos que a regulamentação da Lei, agora em curso, não subverta e dificulte com novos retrocessos os passos positivos que foram dados.
(...) O impacto da imigração legal na Economia e nas Finanças Públicas em Portugal é hoje significativo. Segundo dados de 2004 do Conselho Económico e Social, os imigrantes são responsáveis por cerca de 5% do PIB nacional e o seu contributo para as contas públicas, através de impostos e taxas, é normalmente maior do que os custos que lhes estão associados, fazendo-os, por isso, contribuintes líquidos para a nossa sociedade.
O documento do nosso Encontro avança com significativo conjunto de propostas que dão resposta a uma justa e coerente política de imigração no respeito pelos direitos dos imigrantes e dos interesses do país. Propostas que vão no sentido de superar as insuficiências da Lei da imigração e da Lei da Nacionalidade, mas também propostas e medidas que permitam, atacar de forma decidida, o recurso ao trabalho clandestino por parte do patronato, o que passa pela maior e melhor intervenção da Inspecção-geral do Trabalho.
(...) Para nós, para o PCP, os trabalhadores portugueses e imigrantes devem ser iguais em direitos e a luta pela igualdade para os imigrantes tem de ser um objectivo central de uma verdadeira política democrática de imigração. Igualdade com os demais cidadãos nos direitos sociais e laborais e igualdade no direito de participação política. (...)»


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